O Contrato Social é o documento que formaliza a criação de uma empresa, estabelecendo as regras fundamentais de seu funcionamento. Pense nele como a “certidão de nascimento” jurídica do seu negócio, detalhando quem são os sócios, qual o capital investido, onde a empresa opera e quais são suas atividades econômicas.
Para ilustrar, podemos comparar o Contrato Social com a escritura de um imóvel. Assim como a escritura prova quem é o proprietário e define os limites exatos do terreno, o Contrato Social define quem são os “donos” da empresa e estabelece as regras do jogo empresarial para todos os envolvidos. Manter este documento desatualizado é como navegar com um mapa antigo: pode levar a decisões erradas, gerar multas, criar problemas com a Receita Federal e, o que é pior, acender conflitos entre os sócios que poderiam ser facilmente evitados com a documentação em dia, conforme determina o Código Civil brasileiro.
Quando é Obrigatório Alterar o Contrato Social? Os 5 Cenários Mais Comuns
Existem diversas situações na vida de uma empresa que exigem, por força de lei, a formalização de uma alteração contratual para que a mudança tenha validade jurídica perante o governo, bancos, fornecedores e clientes. Ignorar essa necessidade é um risco que nenhum empreendedor deveria correr.
Aqui estão os cenários mais frequentes:
- 1. Mudança de Endereço: Seja uma mudança para uma nova sala no mesmo prédio, para outra cidade ou até mesmo para outro estado, a alteração do endereço da sede precisa ser formalizada.
- 2. Entrada ou Saída de Sócios: A composição societária é o coração do contrato. Qualquer alteração, seja pela venda de quotas, falecimento de um sócio, exclusão ou a entrada de um novo investidor, deve ser registrada.
- 3. Alteração do Objeto Social: Se a empresa decide expandir suas operações e começar a oferecer um novo produto ou serviço que não estava previsto no contrato original, o objeto social precisa ser atualizado.
- 4. Mudança no Nome Empresarial (Razão Social): Seja por uma estratégia de rebranding ou porque a denominação antiga já não representa o negócio, a mudança do nome oficial da empresa exige uma alteração contratual.
- 5. Aumento ou Redução do Capital Social: Quando os sócios decidem injetar mais recursos na operação (aumento de capital) ou, em situações específicas, reduzir o valor investido, essa movimentação deve ser refletida no contrato.
É crucial entender que operar com qualquer uma dessas mudanças sem a devida alteração significa que, para o mundo jurídico, a mudança simplesmente “não existe” oficialmente. Isso pode invalidar contratos, bloquear financiamentos e criar uma perigosa insegurança jurídica para a operação.
O Passo a Passo Detalhado para Registrar a Alteração Contratual
Etapa 1: Deliberação dos Sócios e Elaboração do Instrumento de Alteração
O primeiro passo acontece internamente. Os sócios devem se reunir e deliberar formalmente sobre a mudança, respeitando o quórum de votação estabelecido no Código Civil ou, se houver, as regras mais rígidas previstas no próprio contrato social. Com a decisão tomada, um profissional qualificado — geralmente um advogado ou contador — redige o documento legal apropriado, chamado “Alteração do Contrato Social”, que consolida a mudança.
Por exemplo, se o contrato social da sua empresa exige unanimidade para a admissão de um novo sócio, todos, sem exceção, devem consentir e assinar a ata da reunião e o instrumento de alteração. Se a regra geral de 75% do capital social for aplicável, essa maioria precisa ser comprovada. Tentar realizar esta etapa sem o aconselhamento profissional pode resultar em um documento com cláusulas nulas ou que será sumariamente rejeitado pela Junta Comercial, atrasando e encarecendo todo o processo.
Etapa 2: Consulta de Viabilidade (Quando Aplicável)
Antes de formalizar certas mudanças, é preciso verificar se elas são possíveis. A Consulta de Viabilidade é uma pesquisa online, realizada nos sistemas integrados da Junta Comercial e da prefeitura, obrigatória para alterações de nome e de endereço.
Imagine que você encontrou o ponto comercial perfeito. Antes de assinar o contrato de aluguel, a Consulta de Viabilidade de Endereço irá confirmar se a atividade da sua empresa (por exemplo, uma pequena indústria de alimentos) é permitida naquela zona urbana, conforme o plano diretor municipal. Da mesma forma, a consulta de nome verifica se a nova Razão Social que você deseja já não está em uso por outra empresa. Pular esta etapa é um risco financeiro: você pode pagar taxas e alugar um imóvel para só depois descobrir que sua empresa não pode operar legalmente lá, gerando um prejuízo direto e evitável.
Etapa 3: Coleta de Dados na Receita Federal (DBE)
Com a viabilidade aprovada, o próximo passo é comunicar a mudança aos órgãos fiscais. Isso é feito através do preenchimento do Documento Básico de Entrada (DBE) no sistema Coletor Nacional da Receita Federal. Este formulário online é o que atualiza o Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ), seguindo um processo padrão nas Juntas Comerciais.
Por exemplo, ao alterar a atividade principal da sua empresa, é no DBE que você informa o novo código CNAE (Classificação Nacional de Atividades Econômicas) correspondente. O DBE funciona como um grande integrador de dados. Sem a aprovação dele, a Junta Comercial fica legalmente impedida de prosseguir com a análise do seu processo. É um passo digital obrigatório que sincroniza as informações da sua empresa em nível federal, estadual e municipal.
Etapa 4: Protocolo e Pagamento de Taxas na Junta Comercial
Com o instrumento de alteração devidamente assinado (hoje, majoritariamente com certificados digitais), a viabilidade aprovada e o DBE liberado, o último passo é submeter toda a documentação no portal da Junta Comercial do seu estado e pagar a taxa de registro correspondente. A obrigatoriedade desse registro é definida pela Lei do Registro Público de Empresas Mercantis.
Na prática, isso significa fazer o upload dos arquivos em PDF e emitir a guia de arrecadação, como a DARE (Documento de Arrecadação de Receitas Estaduais). É somente após a análise e o “deferimento” do processo pela Junta Comercial que a alteração passa a ter validade legal e pública, protegendo a empresa, os sócios e terceiros.
“Art. 36. Os documentos referidos no art. 32 deverão ser apresentados a arquivamento na junta, dentro de 30 (trinta) dias contados da sua assinatura, a cuja data retroagirão os efeitos do arquivamento; fora deste prazo, o arquivamento só terá eficácia a partir do despacho que o conceder.”
Perguntas Frequentes (FAQ)
- Pergunta 1: Preciso de um contador ou advogado para fazer a alteração?
- Resposta: Embora para sociedades limitadas (LTDA) a lei não exija a assinatura de um advogado em todos os tipos de alteração, a contratação de um profissional é altamente recomendável. Um erro na redação do ato, no preenchimento dos formulários ou na sequência do processo pode causar o indeferimento na Junta Comercial, gerando custos adicionais e atrasos significativos. O profissional é a garantia de que tudo será feito em conformidade com a legislação vigente.
- Pergunta 2: Quanto custa para alterar o contrato social?
- Resposta: Os custos variam consideravelmente por estado e pela complexidade da alteração. Os valores envolvem a taxa da Junta Comercial (que pode ir de R$100 a mais de R$400), o custo do certificado digital (caso os sócios não o possuam) e os honorários do profissional contratado para executar o serviço, seja ele contador ou advogado.
- Pergunta 3: O que acontece se eu mudar de endereço ou sócio e não registrar a alteração?
- Resposta: A empresa fica em situação irregular. Perante a lei, o endereço antigo e a composição societária anterior continuam sendo os únicos válidos. Isso pode trazer consequências graves, como impedir a obtenção de crédito bancário, bloquear a participação em licitações públicas, gerar multas e, num cenário pior, responsabilizar um sócio que já se retirou da empresa por dívidas futuras.
Sobre o Autor
Valter Marcondes Leite é um Advogado Empresarial e de Direito Digital com uma visão estratégica que integra o universo jurídico à tecnologia e à gestão de negócios. Com quase uma década de prática em sua banca, Marcondes Advocacia, e uma robusta formação que inclui MBAs em Direito Empresarial e Gestão de Projetos (FGV), Pós-graduação em Direito Digital e Compliance (Damásio), Mestrado em Empreendedorismo e Gestão (UNIFACCAMP), e graduações em Direito, Administração (com ênfase em Análise de Sistemas) e Ciências Contábeis, Valter oferece consultoria jurídica e tecnológica especializada. Sua expertise abrange Segurança da Informação, LGPD, Direito de TI, contratos, compliance, e gestão de empresas em crise. Atualmente, também contribui academicamente como Docente na Cogna Educação e UNIFACCAMP, lecionando disciplinas como Direito Cibernético.
Referências
- Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil): https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm
- Lei nº 8.934, de 18 de novembro de 1994 (Lei do Registro Público de Empresas Mercantis): https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8934.htm
- Passo a passo para Alteração de Sociedade Empresária Limitada (JUCEPAR): https://www.juntacomercial.pr.gov.br/Pagina/Passo-passo-Sociedade-Empresaria-Limitada-Alteracao-sem-Consulta-Previa